Assim que Adanna se aproximou, notou os filhotes conversando animados com Akili e suas companheiras. O ar triste da princesa não passou despercebido pelos outros filhotes, que decidiram não pressioná-la para falar. Sabiam como a relação dela com Thadi era. O leão de juba vermelha era um ótimo rei, diga-se de passagem, mas como pai, Thadi cometia erros que, em sua maioria, eram consertados por Habi.
— Ei, Kisai — Hakuwa começa, sorrindo incerto para a filhote, que tinha parado de correr com os outros para recuperar o fôlego. — Como foram parar na floresta? N-Não quero parecer intrusivo e peço desculpas se eu estiver sendo, mas estou curioso.
Kisai solta um suspiro, aborrecida pela pergunta.
— Kisai e eu fomos sequestradas quando éramos mais novas — Akili se aproxima, falando pela irmã e ganhando um aceno de cabeça da outra como um agradecimento silencioso. Enquanto Akili falava, Kisai se afastava, despercebida por Hakuwa. — Bípedes, como os chamávamos, nos levaram para um “centro de pesquisa” e isso — gesticulou para a franja com os olhos —, aconteceu. Foi lá que conhecemos nossas amigas.
— Nossa mãe chegou lá prenha — Wazi se aproxima, sentando-se ao lado de Akili, que esfregou o rosto carinhosamente na bochecha da amiga. — Mamãe era uma espécie de nômade, ela contava histórias tão incríveis... — A filhote de pelo claro solta um suspiro sonhador, mas sua expressão muda para uma tristonha. — Os bípedes acreditavam, por algum motivo, que Wami e eu iríamos desenvolver o mesmo comportamento de mamãe, mas não aconteceu.
— Mamãe tentou nos defender quando um dos humanos entrou em nossa jaula para nos separar e tentar nos forçar ao “nomadismo” — Wami se intromete, bufando enquanto se aproxima, ganhando a atenção dos outros filhotes, que a seguem. — Eles a classificaram como “instável e perigosa”, levaram ela embora e nunca mais a vimos.
O semblante das gêmeas de pelo claro mostrava tristeza e, para os filhotes restantes, era explícito o que havia acontecido com a mãe das pequenas. As próximas a contar sobre o passado no centro de pesquisas eram as trigêmeas.
— Nós nascemos na fronteira de um reino, pelo que posso me lembrar — Mwezi começa, desviando o olhar para o chão, tentando lembrar dos detalhes. — Nossos pais foram mortos pelos bípedes e nós fomos levadas para o centro.
O clima entre os filhotes estava tenso depois das histórias. Nenhum filhote do reino achava que algo tão cruel pudesse acontecer, ainda mais com filhotes.
— Que... Que história — comenta Elimu, o filhote cinzento de olhos vermelho-alaranjado. — Vocês passaram por maus bocados.
— Bem, de certa forma — Jioni abre um sorriso pequeno. — Não foi nada que não pudéssemos suportar.
— Estamos aqui agora, é isso que importa — Kisai, que tinha se afastado durante o início da interação, agora se aproximava novamente, assustando os filhotes. — Além disso, o passado está morto, não há necessidade de remexer no que passou.
— Ora, mas que filhotinha poética — Uma voz feminina diz. Estava um pouco distante, acima da cabeça dos pequenos. Os filhotes olham para cima surpresos, vendo uma leoa de pelagem dourada e várias cicatrizes que davam um charme extra para a leoa deitada em um galho. — Devo dizer, em um grupo de oito, vocês são bem barulhentos... Já em um grupo de quinze, me deixam com enxaqueca — a leoa solta uma risadinha, se espreguiça e desce da árvore, aterrissando na frente do grupo.
— Tia Wonaji! — Utay começa, se aproximando e esfregando o corpo na pata da mais velha. — Achei que tivesse ido treinar as adolescentes. — A leoa sorri para o menor e lambe sua testa.
— O treinamento é depois do almoço hoje, resolvi procurar um lugar para descansar — Wonaji nota as sete novas adições e sorri. — Ah, vocês acordaram, graças a Mkuu. É um prazer finalmente vê-las de pé. Wonaji às suas ordens. — Fez uma reverência brincalhona que fez as filhotes sorrirem e soltarem risadinhas.
— Tia Wonaji, por quê estava lá em cima? — Usawa, que se aproxima do primo, indaga. — Quer dizer, aqui geralmente é bem barulhento, especialmente esse horário.
Wonaji hesita. As orelhas da leoa abaixam involuntariamente.
— Estava apenas... Observando alguém, acabei cochilando — abriu um sorriso forçado e nervoso. Utay e Usawa sabiam bem quem Wonaji observava mas ficaram quietos, não queriam deixá-la desconfortável.
— Observando? — Akili parecia ter encontrado a voz de novo e estava curiosa. — Isso parece meio... errado, não acha?
— Observar não faz mal, afinal, minhas intenções não são ruins — sorriu para a filhote. Sabia que, por serem novas no reino, as sete filhotes estavam curiosas, principalmente sobre os relacionamentos e costumes do novo lugar. — Eu apenas o admiro de longe, nada mais.
— Seria mais educado e apropriado iniciar uma conversa, não? — Kisai se intromete, inclinando a cabeça.
Wonaji solta uma risadinha amarga. — É uma história complicada, pequena — o olhar da leoa encontra o chão. — Complicada e triste. Não quero aborrecê-los com isso.
— Por favor, tia Wonaji — Wazi começa, fazendo uma carinha pidona. — Temos tempo, além disso, adoraríamos ouvir sua história.
— Não vamos forçá-la a contar se não quiser, é claro — Kisai completa, deitando-se ao lado de Akili.
Wonaji se deita na frente dos filhotes. — Bem, por onde eu começo? — A leoa faz uma expressão pensativa. — Antes de morar aqui, meu reino era Butsara. É um reino cheio de desfiladeiros íngremes e rochas afiadas, mas muito bonito — Wonaji sorri com as memórias de sua juventude. — Meus pais morreram pouco depois de eu nascer devido a uma doença, e eu aprendi a me virar sozinha, mas não estaria aqui hoje, sabendo o que sei, sem a ajuda de Waganga, a curandeira chefe de lá. — Wonaji solta uma risadinha ao lembrar das peripécias de Waganga. — Aquela velha gagá não parava quieta um minuto sequer. Um dia, antes da minha primeira caçada, um leão visitou o reino. Ele era bonito, gentil e muito cortês. Nos demos bem desde o primeiro dia — ela fez uma pausa. — Acabamos nos casando eventualmente e tivemos gêmeos, um macho e uma fêmea.
Os filhotes ouviam atentos, interessados na história. Não usavam soltar nem um pio.
— Jinjo tinha acordado tarde e brincava perto de nós naquele dia, e Alec tinha saído mais cedo para brincar com os outros filhotes — ela continua, abaixando as orelhas. — Ele estava voltando para casa quando ouvimos seus gritos desesperados — os filhotes soltam suspiros incrédulos. — Corremos na direção dos gritos mas era tarde demais quando chegamos. Um grupo de hienas se alimentava do que sobrou do corpo dele — Wonaji franze a testa. A memória era dolorosa, principalmente porquê se tratava de seus bebês, mas ela se recusava a parar. — Achávamos que não poderia piorar até que ouvimos os gritos de Jinjo. Voltamos para salvá-la, mas ela também estava morta. O grupo de hienas era ainda maior e, quando nos viram, nos atacaram — os filhotes seguravam as lágrimas com a história. Nem mesmo Usawa e Utay, que eram meses mais novos que os filhos de Wonaji, lembravam que a história era tão gráfica. — Algumas conseguiram encurralar Askari e o empurraram com força contra uma parede de rochas. Ele acabou inconsciente. Tentei correr para salvá-lo, mas elas me derrubaram também.
A próxima pausa de Wonaji foi mais longa. Ela tentava formular as palavras, não queria assustar ainda mais os filhotes. Vários flashes passavam pela cabeça da leoa, quase a deixando em estado catatônico. Ela lembrava vividamente dos gritos de seus filhos e dos pesadelos que vieram depois do trauma de não poder salvá-los. Eventualmente, ela solta um suspiro.
— Quando acordei, estava na caverna das curandeiras. Meu olho estava enfaixado e eu sentia a queimação incômoda das ervas medicinais em meu rosto e corpo. Uma das curandeiras, Belladonna, veio falar comigo. Disse que os ferimentos de Askari eram graves, mas ele sobreviveria. Ela estava apenas preocupada com a memória dele — mais uma pausa longa. O vento na relva era o único som da área. Era como se o reino estivesse sentindo a tristeza de Wonaji e ficado em silêncio em forma de respeito. — Ela disse que ele tinha acordado antes de mim, estava desnorteado, não sabia quem eram as curandeiras, não sabia onde estava... Tentei seguir em frente e lidar com a perda de meus filhotes, mas era praticamente impossível. Então, me aproximei de Askari novamente — a leoa abre um sorriso tristonho e suspira. — Deu certo por um tempo, até que ele disse que ia sair do reino. Fiquei devastada com a notícia, mas desejei o melhor para ele. Fiquei em Butsara por mais alguns meses e então vim para cá. Vaguei por três dias até chegar aqui. Depois de uma semana me ajustando descobri que Askari tinha vindo para cá também e agora, só o observo de longe.
Os filhotes ficaram quietos por alguns segundos. Adanna, Wazi e Mwezi soltavam algumas lágrimas e Wonaji se levanta.
— A essa altura, acredito que Askari já tenha seguido com sua vida, com ou sem lembranças de mim ou do que tivemos — o tom da leoa era tristonho, mas ela mantinha sua expressão neutra. — E, como a pequena de franja colorida disse... Não há necessidade de remexer no que passou — ela abre um sorriso pequeno e os filhotes encaram curiosos, surpresos com a mudança repentina de humor da mais velha. — Tem uma árvore enorme na floresta, pequenos. Por que não vão brincar lá? Kinga estava lá hoje cedo com alguns guepardos — ao ouvir o nome, Elimu ergue as orelhas animado. Sua mãe tinha saído cedo hoje, sem avisar para onde ia, o que era estranho, já que ela se preocupava com a saúde do pequeno, então sempre o avisava quando sairia e voltaria. — Disse alguma coisa sobre “ajudar guepardos feridos” ou algo nesse efeito — a leoa começa a se afastar, dando uma última olhada para os filhotes por cima do ombro. — Aproveitem o dia, pequenos.
Eles a observam até que ela desapareça no rochedo das cavernas.
— Então, quem vai querer ir até a árvore? — Wazi indaga, encarando os filhotes, que dão de ombros e adentram a floresta.
[...]
Os filhotes passaram um bom tempo andando. Estavam cansados e a floresta ficava cada vez mais e mais densa. Nenhum dos filhotes do reino tinha se aventurado tão profundamente na floresta - exceto, talvez dois deles mas, se perguntados, iriam negar até a morte.
— Estamos perdidos — Jioni comenta, parando de andar e se sentando. — Wonaji mentiu para nós?
— Tia Wonaji não mentiria para nós! — Utay defende, franzindo a testa e parando também. — Mas, talvez ela tenha se enganado.
— Sim — Usawa concorda. — Estamos andando há um bom tempo, talvez devêssemos... — Ele é interrompido por risadas femininas. — E-Ei, não é hora de dar risada!
— Não fomos nós, gênio — Kisai retruca sarcástica enquanto revira os olhos. — Não somos tolas para rir numa situação dessas.
— Se não são vocês, quem é? — Kumi, curioso, inclina a cabeça.
As risadas começam novamente, alarmando os filhotes. — Só tem uma maneira de descobrir. — Akili, intrigada pelas risadas, começou a seguir os sons. Suas seis colegas seguiram, forçando os outros oito a acompanhar.
Os quinze finalmente tinham chego à árvore que Wonaji tinha citado. Avistaram nos galhos mais altos, duas guepardas: eram mais agitadas que os outros guepardos do reino, muito provavelmente pré-adolescentes. A maior das duas tinha quatro listras horizontais nas patas dianteiras, duas das quais formavam um diamante "arredondado" que apontava para baixo. Em suas orelhas residiam pares de pequenas listras e, em suas patas traseiras, mais duas listras. O padrão da pelagem da gueparda menor, embora similar ao da gueparda maior, parecia ser invertido. Pelo que os filhotes observaram, a guepardo maior estava com a pata dianteira esquerda enfaixada e mancava um pouco quando dava alguns passos nos galhos.
Os filhotes também notaram um leão deitado no chão. A juba dele era um tom de branco azulado e, apesar de incompleta, dava para notar que ele era um adulto. Ao lado dele estava uma leoa, de costas para o grupo de filhotes; seu pelo era marrom claro. Os dois leões conversavam, parando ocasionalmente para responder as guepardas.
Elimu, ao ver a leoa, se anima e corre na direção dela, parando para recuperar o ar na metade do caminho. Quando recuperado, o filhote caminha com mais calma até a leoa e se esfrega contra a lateral do corpo dela, a surpreendendo.
— Saiu cedo hoje, mamãe — o filhote comenta, soltando uma tosse curta. — Tia Wonaji disse que você estaria aqui — os outros filhotes se aproximam. Estavam hesitantes, diga-se de passagem, afinal, não sabiam se o leão era uma ameaça. — Quem é esse?
— Peço desculpas, amorzinho — Kinga sorri apologética e lambe a testa do filhote. — Sania se machucou e Saja pediu minha ajuda para curá-la.
— Saja fez um drama totalmente desnecessário, devo acrescentar — a gueparda de pelo escuro acrescentou, soltando uma risada e descendo da árvore com dificuldade, seguida pela gueparda menor. — Euclásio aqui estava se certificando de que não me machuquei mais do que o necessário.
— Prazer em conhecê-los, pequenos — o leão sorri. Akili e Kisai o encaram por um tempo. Ele parecia... familiar. — Kinga falou muito de vocês, amores — Euclásio se levanta e os filhotes se estremecem. Ele, com certeza, era maior que Thadi por alguns centímetros.
— O-o prazer é todo nosso, tio Euclásio — os quinze respondem em conjunto.
Utay pigarreia. — Tia Wonaji disse que não teria problema se usássemos esse lugar para brincar, tia Kinga — ele sorri nervoso.
— Enquanto as guepardas estiverem aqui, tudo bem — o tom de Kinga muda de animado para sério. — Euclásio e eu ficaremos mais um tempo, mas não demorem muito para voltar para o reino, sabem que, além de guepardos, também tem hienas e forasteiros nessas áreas.
Os filhotes concordam com a cabeça e começam a brincar com as guepardas enquanto Kinga e Euclásio conversam. Eventualmente, os dois adultos acabaram voltando para o reino enquanto os filhotes e as guepardos continuavam a brincadeira.
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OLÁ TERRÁQUEOS SAUDAÇÕES )0)
Sua alienígena favorita está de volta. Turu bom com vocês? Espero que sim -w-
Bem, cá está o capítulo dois atualizado. Quero dizer também que, devido a alguns probleminhas pessoais - não se preocupem, está tudo voltando ao "normal" agora - eu tive dificuldades pra atualizar o blog, tanto que a última postagem foi em maio e a última atualização de algum post foi em junho.
Como deu pra notar, na atualização do capítulo um, eu mudei as cores da Ariana e do Wiba. Já que eles moram em um Oásis cercado por um deserto, as cores deles deviam ser mais... terrosas (?) para combinar com o lugar e dar mais espaço para a camuflagem.
Ah, eu também queria dizer que, muito provavelmente eu acabe reescrevendo só os três primeiros capítulos, já que eu estou bem satisfeita com a escrita dos capítulos quatro e cinco. É capaz que eu até poste o capítulo cinco em breve, fiquem alertas. Vou aproveitar e falar que estou alterando levemente as pontuações dos capítulos anteriores também, já que eu não os revisei antes de postar, gomen ^^'. Acho que também vou mudar a escrita do capítulo três e fazer os trigêmeos - Kami, Hasa e Walimu - aparecerem algumas semanas depois das meninas, ou seja, o capítulo três vai ser totalmente reescrito também.
Edit [02/2024]: Pode ser que alguns personagens tenham seus nomes alterados de novo, como o do Usawa. Eu gosto de usar nomes similares quando os personagens são irmãos, como é o caso da Wami e da Wazi, mas o Sawa e o Usawa são primos e eu não quero mudar isso, então vou alterar o nome do Sawa o quanto antes :D
Por hoje é só. Espero que tenham gostado. Um beijo da Nathy, fiquem com Kami e bye -3-